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Eu queria tanto ter um dom. Tem gente por aí com muitos exemplares dessa raridade. Gente que canta, dança e sapateia; Gente que pinta o sete. E eu? Meu dom é não ter dom, buscando eternamente por ai. Eu gostaria de ter muitos, milhares deles. Ser recheada , redonda, gorda de dons. Gorda com orgulho! “Você é gorda porque?” e eu responderia na lata “Porque tenho muitos dons e eles me dão esse recheio!”. Ai, eu seria capaz até de explodir. Mas não de gordura, de dons!
Vocês não sabem o quanto ja procurei: nas músicas, no palco, na poesia. Em frente ao espelho, em cima do fogão. Abri geladeira, fechei o zíper. Pintei e bordei, mas o dom eu não achei. Até em Machado em procurei. É, no de Assis. Mas só encontrei o Casmurro. E esse eu não queria, queria o dom sozinho, sem compromisso com ninguém. Sozinho pra me acompanhar por ai, no teatro, na dança, no cinema. Nas noites, nas poses. Nas telas, nas tintas, nas cores. Ah dom, por que fuges de mim?
Medo e Solidão.
Sombras, muitas delas. Frio, medo e solidão. Erros, erros e acertos em vão. Tentei chorar, mas tudo estava seco. Lágrimas petrificadas, olhar mortificado e alma vazia. Incerteza, medo e solidão. Amor que não é igual, paz que não existe. É um rebuliço interno, uma força que me puxa. Desasossego, incômodo cômodo. Besteiras, palavras soltas, palavrões. Acuso, uso e desuso. Medo e solidão.
Farsa, máscara que não cai. Amizade que não existe, homem que não é. Sentimento que já foi, tempo que já passou. Foi a hora, agora restou o desgosto, o gosto. Amargo pra combinar com mágoa. Azedo pra combinar com medo. Me dê a sua mão.....Medo e solidão
Dias longos, noites longas.
-Alô, amor? Liga pro primeiro hotel baratinho que você encontrar e reserva quatro diárias para mim. Estou indo te ver!
Ela soltou um sim tão cheio de alegria, um sim tão esperado que fez meus lábios se abrirem num imenso sorriso. Desliguei o telefone com o coração na boca. Enfim íamos ficar juntas. Esses quatro dias valeriam por quatro anos. Depois de seis meses sem nos vermos, somente uma semana separava nossos corpos, nossas bocas e mãos. Quanta ansiedade!
- Mãe, não se preocupa. Minha amiga vai me buscar no aeroporto. Tudo pelo meu futuro profissional.
Se minha mãe me aceitasse como sou, ou ao menos tentasse entender e não proibi; Se não me tratasse como uma doente que precisa de cura, eu não precisaria mentir. Não é errado, não é pecado. É amor.
Embarquei ansiosa, pronta para largar as malas num canto qualquer e ir de encontro a minha pequena. Tomá-la nos braços, acariciar seus cabelos e beijá-la. Beijá-la muito.
-Oi moça, tenho uma reserva feita no nome de Sabrina Félix.
Subi as escadas correndo; Esbarrei num casal e nem me lembrei de pedir desculpas. Tinha algo muito importante a tratar: ligar pra ela e avisar que já estava a sua espera. Coloquei a chave na fechadura e ela travou. Droga! Mais uma volta e agora sim, porta aberta. Acendi a luz e qual não foi minha surpresa ao ver diante dos meus olhos um móvel que era um misto de banco de praça e um cavalo, num tom vermelho boca! Fiquei olhando aquilo por um breve instante, tentando imaginar qual a utilidade daquilo num quarto de hotel. Percorri o quarto com os olhos, na tentativa de achar algo mais comum a minha visão tão acostumada com quartos de pousada. Nada, nada me era familiar: Cama redonda, luzes neón, uma espécie de cofre atrás da porta cheio de guloseimas, colchão com estofado estranho, vidro separando o cama da banheira. De repente um estalo na minha cabeça. Motel! Era isso, eu estava num motel!
-Pequena, corre pra cá e venha ver onde me meti.
Não tive reação de fazer nada, apenas sentei-me numa cadeira e fiquei esperando ela chegar. Tocou a campainha e ao abrir a porta meus olhos encontraram aqueles olhos cor de amêndoas que eu tanto ansiava ver. Apertei-a num abraço tão apertado, tão saudoso que tive a impressão de nos sufocarmos mutuamente. Coloquei minhas mãos em sua face, tapando-lhe a visão e coloquei-a no meio do ambiente.
-Olha que hotel interessante você reservou pra mim! Temático, não!?
Sua cara de “o que é isso?” era impagável. Seu susto fora tão grande quanto o meu. So nos restava rir. E rimos, rimos muito de tudo aquilo. De toda a confusão. Caimos na cama de tanto gargalhar, rolamos no colchão.
- Sá, olha isso. Pêlos e cabelos no travesseiro.
Que nojo! Os travesseiros estavam cheios de fios alheios que se espalhavam pelo lençol. O colchão estava manchado e marcado. Nojo, muito nojo!
Desci as escadas, arrastando ela pelas mãos. Que lugar é esse? Que porcaria é essa?
-Moça, meu quarto está todo sujo. Tem pelos por todo lugar. Quero roupa de cama limpa, afinal estou pagando!
- Olha só, isso aqui é motel é???
- Sim, senhoritas. É um misto de hotel com motel. Todos na região são assim. Mas não se preocupem, mandarei trocar a roupa de cama agora!
Eu estava pagando pra ficar num motel que ainda por cima deixava resíduos dos outros pros próximos clientes? Não, isso não estava acontecendo comigo! Ah se minha mãe soubesse o que estava acontecendo com sua filhinha...Morte na certa!
Lençóis e fronhas novos, mas na dúvida cobri o colchão com a colcha q levei de casa e usei minha mochila como travesseiro. Certeza de que são limpos. Demorei a pegar no sono, pensando nos acontecimentos das últimas horas.
- Oh! Eu vou te comer toda, sua safada! Quer levar na cara, quer? Então toma! Cachorra, minha cachorra. Aaah! Oooh!
Meu Deus, isso não estava acontecendo comigo! Estava sendo acordada pelos gemidos e perversões do quarto ao lado. Eram tantos gemidos e obscenidades que eu me sentiria menos envergonhada se tivesse assistindo a um filme pornô com os amigos. Não, eu não merecia isso. Uma sinfonia de gemidos e grunhidos a noite inteira.
O que eu esperava também? Estava hospedada em um motel de quinta categoria. Seriam quatro longos dias e 4 longas noites. So me restava levar com bom humor e fazer dessa minha primeira ”experiência moteleira”.Tudo por amor...


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Correndo a frente do sol
Viver é colecionar momentos. Juntar sensações, cheiros, gostos, amigos. É recordar cada minuto bom, guardá-los no relicário do coração. Hoje me peguei pensando nas férias que quero ter; Nesse pedaço de vida que desejo guardar.
Fecho os olhos e imagino uma curva de rio, um aroma fresco, o verde do capim molhado e a poeira que se levanta ao passar do ônibus. Sorrisos, muitos sorrisos de” bem vindos”. Uma cidadezinha qualquer, um mês qualquer. Amor, muito amor.
Chegar a tempo de ver o dia nascer, correr a frente do sol. Ouvir os pássaros, canto matinal, cheiro de leite morno saindo das casas, crianças correndo. Jogar as malas num canto qualquer e abrir as janelas. Escancarar as portas e janelas do coração, deixar a sorte entrar. Ser livre pra viver cada sensação que o dia nos reserva.
Ruas de paralelepípedo, calçadas que nos convidam a sentar. Pessoas no seu vai e vem, bichos, muitos deles. Flores, capim, frutas, brincadeiras. Paz!
Sentar na soleira da porta e se deixar levar pelo dançar das nuvens. Imaginar monstros, bruxas e fadas. Um conto em algum canto do céu. Quase um êxtase, um transe infantil. Infância, palavra viva, travessa, recheada de pequenos significados; Da minha, eu escolho memória. E é dessa memória que eu quero viver. Reviver. Eternizar momentos.
O cheiro que sai dos fogões a lenha desperta, faz algo se remexer. Pão de queijo, polenta, feijão quentinho. Comida de vó. Doces pra adoçar a alma. Alma minha, livre, feliz.
Banho de cachoeira, água fria escorrendo pelo corpo. Queixo batendo, cabelos molhados, pés enrugados. Sintonia com a natureza. E o céu, azul como ele só. Borboletas no jardim. Cachorros que latem, velhos que assoviam. Os sinos da Igreja tocam, anunciando o finzinho de tarde que vem vindo. E com ele, o vento gelado do verde que está em todo lugar. A noite se debruça no nosso quintal; É quase possível tocar a lua. Me sinto viva, capaz de colher estrelas. Um punhado delas. Guardarei seu brilho em meus olhos. Tic tac do relógio, vida que segue arrastada, passos lentos.
Vai, passa devagar, me leva... Quero ir com você.


Antes que me perca mais...
Pés no chão, cabelos desgrenhados, hálito de sono. Cortinas fechadas e aquele cheiro de café. Uma ideia persiste na cabeça: tenho que encontrar o que me faz melhor.
A mesma roupa de todo dia, o mesmo caminho. Ônibus cheio, pessoas e bichos. Bicho humano e seu odor fétido. O barulho do motor é agressivo; o empurra empurra das mulheres, irritante; O roçar dos homens me enoja. Eu aguento. Um dia novo para uma vida velha.
Abro as portas e espero. Que as horas passem, que as pessoas passem. Que passe tudo; dos anos aos séculos. Que passe a indiferença, a exaustão. A melancolia e a submissão. Passa, passa, vai passando. Vai correndo e marcando meu chão. Não, espera. Espera eu me descobrir, me achar. Espera minha limitação. Espera...
O relógio não para, corre. Cadeiras se arrastam, livros repousam, máquinas ligam e desligam. Alguém dorme enquanto outro acorda. Muitas palavras, fórmulas e papel. Riscos de tinta, forma e conteúdo. Giz! Desenha, rascunha e apaga. Eu queira ser tanta coisa e sou nada...
Olhos abertos, silêncio da noite. Carros que passam e pensamentos que voam. Tanta coisa pra ser dita, tanto eu pra expor. Meus olhos não são os mesmos, meu espelho já não me reconhece . Saidas e amigos não são tudo, eu já fui mais.
Vasculha, remexe, desarruma. Para e pensa. Alinha as ideias, reformula, põe base. Arrisca. Sai da zona de conforto. Eu quero brilho, mostrar a cara. Foco!
Cansei...

Hoje eu acordei querendo uma encrenca. Vontade de puxar conversa, de xingar pessoas. Acordei pra colocar a boca no mundo, pra gritar, descabelar a minha mãe. Meu ovo ta virado, to munida de insultos. Palavra e palavrão. Não to afim de sorrisos falsos e amarelos. Prefiro uma escarrada. Que seja na cara, que seja sincera. Não, Não e não! Odeio negação.
Tem gente que me irrita, tem coisa que me grila. Mas eu vou levando. Hoje eu resolvi baixar o nível, jogar pra fora, vomitar essa indignação. Foda-se se vão me amar, Foda-se se me odiarão. Foda-se, foda-se e foda-se! Vamos fuder?
Eu não nasci pra “nhem nhem nhem”, não sei brincar de cinderela. Frescura me cansa; fala mansa me cansa; “ogrisse” me cansa. Mundo rosa eu repudio; conto de fadas na vida real não acredito. Gente me encanta. Mulheres me assustam e homens me intrigam. Crianças me roubam sorrisos. Gargalhadas. Por isso conservo a criança que há em mim, pra sorrir e gargalhar por dentro. É, eu não choro por qualquer um.
Cansei de ouvir lamúrias, de remediar tristezas. De dar fim a dores que não existem. Cansei de mostrar que a vida é bela. Tem gente que nunca vai entender, vai sempre chorar, soluçar, entrar em prantos. E nunca, jamais, será capaz de ter os olhos brilhando. Esse brilho é pra poucos, quiçá pros loucos. Esses sim sabem viver. E vivem, como vivem! É, em outra vida eu quero ser louca. Por isso nessa eu to fazendo estágio, me preparando, trabalhando meu interior. Libertando meu espírito, aquecendo o coração. To sendo criança, velha, homem e bicho. To misturando tudo e criando uma poção: Eu. Essa que não troco por ninguém. Em outra vida eu troco pela loucura!
O problema deve ser comigo, ou quem sabe a solução. Eu choro, fico na fossa, entro em depressão. Não canto, não encanto. Paro de viver. Mas uma hora eu me toco e retoco. Boto música, enfeito a alma. Floresço meu jardim, rego meus amigos e planto vida nova. Nova, novinha em folha. Boto carão, escancaro nos sentimentos e renasço. Mas tem gente que não. Reclama de tudo, só vê defeito no mundo. Não acredita nas pessoas, situações e destino. Só chora, chora e chora! Quer ficar entre as cobertas, em um mundo cinza. Deixa as janelas fechadas, as plantas morrerem e secam por dentro. Param de sentir o ar, o sangue correr. Vivem em função da espera. Esperam um mundo novo, uma vida nova, um amor novo. Sim, elas simplesmente esperam. E isso me irrita. Me dá vontade de gritar, de xingá-las, colocar a boca no mundo, descabelar a minha mãe. Virar o ovo, me munir de insultos. Palavra e palavrão.
Quer? Então faça acontecer! Eu cansei de aconselhar, de dizer “não é bem assim”, “vai, tenta, insiste”. Cansei de falar a toa, de mostrar que tudo tem seu valor. A vida não é feita de amores, namoros e carências. Não a minha. Meu viver ta recheado de amigos, lugares e sensações.De momentos,cheiros, beijos, carícias e tesão. Não, não é pecado! É viver!
Hoje foi o último dia. Acordei querendo encrenca mas não causei. Decidi parar por aqui. Pra mim já deu. Falei e repeti. Cansei. Esgotei. Cheguei no meu limite. Agora foda-se! Cada um vive como quer...

Alôs e beijos
Não é doença, nem paixão. Muito menos amor. É encanto, encontro de almas. Vidas que se esbarram, amigos que se fazem. São histórias, casos, beijos e abraços. Alôs e tchau´s. É nada, porém, tudo.
É um pensamento longe, recheado e vagando. São encontros e despedidas, frases de todo dia, palavras ditas. É o arrependimento das entrelinhas, da não explicitação. Suor das mãos, boca que se abre, som!
É uma possibilidade que voa, voa..

Vai, sai de mim e pousa em outras mãos.

  • Eu sou assim

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    Um emaranhado de pessoas, gestos, palavras, cheiros, sensações, lembranças e um toque de personalidade. Conheço meus limites e nem por isso me limito. Em eterna busca de mim... Será que um dia me encontro por ai? Sem querer rotular, já me rotulei...

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